Suporte

Parecer FMUSP referente Fibromialgia

São Paulo, 29 de outubro de 2013.

 NCR    61/2013

Ilmo Sr.

Dr Walber Pinto Vieira

Presidente da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR)

 

Pelo presente tomei conhecimento do parecer elaborado por vossa Comissão de Dor, Fibromialgia e Reumatismo de Partes Moles cuja interpretação por pessoas leigas pode levar ao errôneo entendimento de que o exame complementar de Termografia não é útil para excluir diagnósticos diferenciais de outras áreas do conhecimento médico.

Temperatura é um sinal vital e é reconhecido seu papel na avaliação das doenças desde antes de Hipócrates. É um dos sinais cardinais da inflamação que pode ser mensurado de modo objetivo e preciso por meio de equipamentos específicos.

É uma informação básica que pode sofrer alterações em diversas situações clínicas.

Diversamente da temperatura central que se mantém constante, exceto nos quadros febris e de hipotermia, a temperatura cutânea modifica-se significativamente frente a diferentes doenças, de modo localizado, regional, dermatomérico, hemicorporal ou sistêmico.

Esta alteração térmica pode representar desde alterações inflamatórias e vasculares até disfunções do sistema neurovegetativo simpático central ou periférico. Portanto, tanto o aumento de temperatura quanto sua diminuição podem se constituir como participante de diversas afecções clínicas.

A literatura científica esclarece isto muito bem, como exemplo, nas seguintes afecções: síndrome de dor miofascial (Fischer 1998, Brioschi e Teixeira 2007, Haddad 2012), síndrome complexa de dor regional (Choi 2013, Niehof 2006, Gulevich 1997, Bruehl 1996), dor orofacial (Lee 2007), doença vascular periférica (Bagavathiappan 2009), varicocele (Kulis 2013), doença de Hansen (Yoshida 1983), síndrome do desfiladeiro torácico (Sucher 1990), esclerodermia localizada (Howell 2009), úlceras de decúbito (Nakagami 2010), pé diabético (NIshide 2009, Armstrong 2007), alergias (Clark 2012) e outras situações como avaliação do resultado de bloqueios anestésicos (Galvin 2006) e de doenças dermatológicas (Mikulska 2006).

Desde 2007 que procuramos expor este tema a Sociedade Brasileira de Reumatologia por meio de um artigo científico com extensa revisão na área (92 referências específicas) e que foi aceito para publicação em vossa revista após ser devidamente discutido e revisado pelos editores (Brioschi e Teixeira 2007).

O mesmo já apontava algumas informações a respeito da síndrome fibromiágica. De igual modo às alterações térmicas que também são presentes na síndrome fibromiálgica, como: anormalidades da termorregulação manifestados por hipersensibilidade ao frio (Larson 2013), extremidades frias (Flammer 2013), vasoespasmo e fenômeno de Raynaud (Chikura 2010), anormalidades do sono (Anderson 2013, Sundelin 2013, Niedermeyer 1984), síndrome do intestino irritável (Arendt-Nielsen 2008, Zhang 2002) e outros.

Apesar destas constatações, a termografia não é um exame definitivo no diagnóstico da síndrome, e sim complementar, pois lida com uma das facetas da fibromialgia que são as alterações neurovegetativas da termorregulação como destacado em ampla literatura disponível à toda comunidade científica por diferentes grupos de pesquisadores (Biasi 1994, Ammer 1995, 1999, 2001, 2008, 2009, Sprott 2000, Martinez-Lavin 2004, Hau 1996, Rothschild 1991, Qiao 1991, Brioschi e Teixeira, 2008).

Devida à vasta abrangência e suma importância deste método na área médica em diversas especialidades, que a FMUSP mantém hoje um curso de especialização com duração de 2 anos em Termologia Clínica e Termografia para formação de médicos experts neste assunto. Nele os alunos aprendem a trabalhar com o método seguindo as exigências de ambiente controlado, seu uso como exame complementar no diagnóstico de diversas doenças e sua aplicação preditiva em perícias médicas. O assunto é também suportado em livros com referências bibliográficas qualificadas (Diakides 2007, Cohen 2008, Brioschi e Teixeira 2009, 2010, 2012, Balbinot 2006, Brioschi e Silva 2013, Brioschi 2010) e consensos internacionais, tal como os organizados no Brasil (ICGMT 2010 e 2011).

Apesar da boa intenção em informar ao leigo de que se trata de exame complementar, como a maioria dos demais exames na área médica e de que seu uso exclusivo e único não é, portanto recomendável para diagnóstico definitivo. Baseando-se no exposto previamente, não nos parece razoável generalizar divulgação de informações incompletas sobre tema tão complexo. Haja vista que, todos os recursos da investigação científica podem ser utilizados para o apoio diagnóstico complementar e diferencial destas síndromes. Não se trata de exame complementar exclusivo para diagnóstico da síndrome fibromiálgica, mas pode ser de grande valia também em outras doenças.

Em vista do exposto, finalmente gostaria que estes apontamentos adicionais fossem publicados com o destaque que foi dado à matéria vinculada pela SBR.

Ficando a inteira disposição para informações adicionais

 

Aceite meus protestos de aceite e consideração,

 

Prof. Dr. Manoel Jacobsen Teixeira

Titular da Disciplina de Neurocirurgia do

Departamento de Neurologia da FMUSP

Coordenador da Especialização em Termologia Clínica e Termografia da FMUSP

 

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